Esculturas Sonoras, Exposição
Na exposição DHAMMA, Narcélio destila um concentrado suco de diversos frutos cultivados ao longo de 15 anos de pesquisa e produção artística. As raízes estão penetradas nos campos da cinética, das construções sonoras e da interatividade com o público. De relance, algumas esculturas de Narcélio lembram os “modulators” de Lazlo Moholy Nagy, um dos fundadores da Bauhaus e da arte cinética. Mas numa segunda vista, surgem diferenças fundamentais entre eles: os cinéticos de Nagy são autômatos, máquinas metálicas ligadas na eletricidade, enquanto os cinéticos de Narcélio precisam do contato humano, de alguém que lhes dê corda ou lhes impulsione o movimento. Se Nagy preferiria que seus aparelhos pudessem ser operados automaticamente por computadores, (e certamente o faria, se tivesse tido a oportunidade de operar recursos da era digital), Narcélio, mesmo tendo acesso a computadores e aplicativos os mais variados, prefere conferir às mãos do público, o poder de movimentar seus cinéticos, dando-lhes velocidade e ritmos diversos e personalizados. Do mesmo modo que as esculturas de Jean Tinguely, as de Nagy soam barulhentas, robóticas, duras e frias, como os metais das quais são feitas. As esculturas de Narcélio produzem música, sonoridades harmoniosas e, eventualmente, melódicas. Existe entre elas uma importante diferença na abordagem com o interlocutor: enquanto Nagy e Tinguely exclamam uma beleza mecânica, Narcélio propõe uma aproximação afetiva, como sugerindo uma colaboração entre máquina e pessoa. Se, em Nagy e Tinguely, a máquina é a protagonista, em Narcélio ela é o instrumento que, tocada pelo humano, resulta em música.
Nesse sentido – da procura de componentes que detonem um processo de aproximação afetiva com o público – os objetos sonoros/cinéticos de Narcélio se aproximam dos inventos provocativos de Guto Lacaz, artista disruptivo e inclassificável, que constrói uma obra originalíssima, banhada em humor ácido e estética acética. Ambos os artistas participaram de uma exposição da qual eu fui o curador, tendo o prazer de poder colocar lado à lado esses artistas/inventores pela primeira vez. O mote da exposição era a ocupação criativa de uma rua por ciclo-objetos, uma reinvindicação do espaço público urbano para a apresentação de arte. Lacaz apresentou a Ciclóptica – uma bicicleta formada por um jogo de rodas que, em movimento, criam efeitos ópticos e Narcélio a WC Ciclo – um banheiro público dirigível. O impacto das obras justificou a participativa e festiva recepção oferecida pelo público no evento.
Com suas esculturas musicais, Narcélio desenvolveu uma sintaxe própria e especialmente comunicativa, que alcança especialistas, crianças ou desavisados que não tenham um aprofundado repertório artístico.
A arte de Narcélio encanta e convida.
Mesmo mantendo rigor formal e profundidade conceitual, sua arte traz para o universo contemporâneo um frescor necessário, um bem vindo acolhimento, traz humor e invenção em doses generosas.